terça-feira, 20 de junho de 2017

PARTE I - APRESENTAÇÃO

ÉTICA III
PROF. DANIEL OMAR PEREZ



Como método avaliativo do semestre ou, como o Mapa de Atividades apresenta para nós, estudantes de Filosofia, a Checagem de Conteúdos prevista para esta semana na disciplina de Ética III, ministrada pelo professor Daniel Omar Perez, é realizar um Seminário sobre um dos temas expostos durante as seis semanas de debates intensos. A apresentação oral acontecerá no encontro presencial e as temáticas serão expostas neste blog.

A realização deste trabalho, portanto, se baseou na escolha da quinta semana, cuja temática é “A HOSPITALIDADE DE KANT EM DEBATE COM DERRIDA E LEVINAS”.

O grupo é composto por Beneir Cunha da Silva Junior,
Cristiani Lopes Silva, Gislãyne da Penha Croce Ferreira, Kerly Nunes de Souza e Maria Elizabeth Ribeiro .


SEJAM TODOS MUITO BEM-VINDOS, AFINAL, A HOSPITALIDADE É POR CONTA DA CASA!!!

PARTE II - NOÇÃO DE HOSPITALIDADE NO SENSO COMUM CONTEMPORÂNEO


Antes de nos aprofundar sobre a hospitalidade de Kant em debate com Derrida e Levinas, entendemos que compreender melhor sobre hospitalidade em nossos dias fará nosso trabalho ser mais produtivo, e assim, com esse conceito definido, nossa compreensão do contexto filosófico ficará facilitado.
Na atualidade, hospitalidade tem sentidos múltiplos, considerando aquilo que diz respeito à ação gratuita de acolher indivíduos vindos do estrangeiro ou grupos migratórios e também àquilo que refere ao turismo e à hotelaria. Hospitalidade então pode sugerir dádiva e também gestão em relação com aquele que não é da casa.
Em nossos dias, talvez a área em que mais desperta estudos de hospitalidade não seja a filosófica, mas sim a econômica. A meta de ser um bom hospitaleiro não é moral, pelo contrário, a ideia é atrair novamente o hóspede, e assim, auferir lucros com essa estadia. Nessa linha de raciocínio que já existe, inclusive, cursos de mestrado voltado para explorar esse segmento (disciplina: Mestrado em Contextos Contemporâneos, optativa do Programa de Pós-Graduação em Turismo da Universidade Federal Fluminense – http://hospitalidadecontemporanea.com.br/disciplinas-em-curso/hospitalidade-em-contextos-contemporaneos-mestrado/).
Após observar esse destaque econômico para a hospitalidade ficamos ainda mais curiosos para entender o real sentido da hospitalidade, entender seu sentido filosófico. Nossa preocupação aumenta quando, procurando no google curiosidades sobre hospitalidade, encontramos várias nações se autointitulando como as mais hospitaleiras. No Japão encontramos o destaque do “Omotenashi”, que significa, em outras palavras, que sua hospitalidade é mais forte que as outras (http://www.japaoemfoco.com/omotenashi-o-espirito-da-hospitalidade-japonesa). Até mesmo em países árabes, onde assistimos em noticiários que estão constantemente em guerras, encontramos a hospitalidade como sendo referencial para todo o mundo. Desnecessário comentar sites brasileiros, onde se vangloriam de serem os melhores hospitaleiros do mundo, certamente no intuito de vender mais pacotes turísticos.

Após essa breve pesquisa, percebemos que a hospitalidade ao redor do mundo nos dias de hoje, tem o mesmo sentido material. Em tudo que pesquisamos sempre encontramos a mesma conotação financeira, a mesma preocupação apenas turística quanto à hospitalidade, e por isso, o estudo deste trabalho torna-se mais importante, uma vez que abordaremos a origem de um termo essencialmente filosófico que se perdeu ao longo dos anos e acabou por ter um significado muito mais restrito e comerciável.

PARTE III - RELAÇÃO HÓSPEDE X INIMIGO - HOSPITALIDADE X HOSTIL

O homem hospitaleiro consiste em ser gentil, o qual prepara o ambiente para receber o próximo. Esse termo está associado à cortesia, respeito e educação. O respeito às diferenças e a alteridade é fundamental no desenvolvimento desta prática.
No entanto, o termo hospitalidade possui uma ligação com a palavra hostilidade.  Hostilidade significa receber o estranho ou o inimigo, na qual desperta o sentimento de desconfiança com visitante. Com isto, a nossa linguagem sempre estará direcionada para lembrar ao visitante que ele não faz parte deste ambiente.
Ao longo de nossas vidas somos hospedeiros de hóspede parasita que nos habitam, e através de nosso comodismo aceitamos até o momento em que não nos tirem da zona de conforto. Os seres humanos, quando não tem vontade ou não podem lidar com os estranhos habitantes, simplesmente o obedecem e deixam fazer morada em seu lar, como se a casa fosse deles. O estranho também tem a função de nos estimular a sair de nossas rotinas, quando nos incomoda e nos perturba. Assim, nos permite encontrar outra perspectiva no nosso próprio ser. O fato de sermos confrontados pelo estranho nos faz com que nos tornemos estrangeiros dos nossos próprios costumes.
O hóspede não possui os nossos costumes e nem se expressa com o mesmo idioma. Mas, é recebido por nós através do dever moral, como ser fosse uma norma ética a ser cumprida.    
Derrida, na leitura dos textos platônicos, cita a acolhida de dois tipos de estrangeiros. O primeiro é aquele que fala nossa língua, possui boas referências familiares e tem um estatuto social. O segundo são os bárbaros, que falam um idioma diferente, que possuem um mal cheiro, tem hábitos alimentares diferentes, não tem estatuto social e nem documentos. No primeiro caso temos o estrangeiro acolhido e no segundo caso o rejeitado. O primeiro estrangeiro se refere àquilo que eu posso ser, como sujeito de legislação, já o segundo estrangeiro é irreconhecível, não e nada e nem ninguém. A distinção se apresenta entre o hóspede e o hostil, entre o hospedado e o hostilizado, ou seja, aquele em que eu me reconheço e aquele que é rejeitado por suas diferenças.
Para Levinas, devemos servir ao estrangeiro sem questionar suas origens, pois me constitui o ser que sou. Assim, me torno responsável pelo estrangeiro, pois é minha responsabilidade ética. Com isto, para esse autor a hospitalidade molda o nosso ser, fazendo parte de nossa essência. Essa responsabilidade ética é consequência por sermos seres sociais que necessitam viver em comunidade.
A hospitalidade, no pensamento de Levinas, está muito associada aos personagens bíblicos, aos pobres, às viúvas e aos órfãos. O acolhimento neste contexto é independente da localização geográfica, da origem, da cultura e entre outros, pois a hospitalidade é servir o próximo sem questionar e é incondicional, e se encontra muito além da caridade e dos bons costumes.

No pensamento de Derrida, esse dever ético é uma obrigatoriedade com aquele que o constitui e recebe uma hostilidade pura e incondicional. O estrangeiro não pode sentir o diferente em minha casa.

segunda-feira, 19 de junho de 2017

PARTE IV - HOSPITALIDADE E KANT – PROBLEMA DA HOSPITALIDADE – DEVER ÉTICO DA RESPONSABILIDADE KANTIANA


Ao tratar a hospitalidade como um dever ético, surge a necessidade de entendê-la de maneira pura e incondicional. O hóspede precisa ser respeitado como o outro, a hospitalidade deve estar aberta ao inesperado, ao estranho, ao novo, ao desconfortável, ao diferente pois, a partir dos argumentos de Kant, este é um problema moral e prático e está tanto no âmbito da liberdade externa, isto é, do direito, como no âmbito da liberdade interna, ou seja, da ética. A ação hospitaleira subtende uma relação consistente entre o dever ético e o dever jurídico, de maneira que, embora sejam diferentes não se contradigam.

Não devemos esperar que o outro, o hóspede, o estrangeiro, se adéque aos meus hábitos, costumes, gestos, mas sim, eu preciso tratá-lo bem, respeitando-o, a fim de que, a minha ação seja um fim em si mesmo.
O imperativo categórico de Kant é uma máxima que exige o exercício dos deveres virtuosos para com os outros, de maneira que a sua observância não resulte “na obrigação da parte dos outros, mas em um dever que é devido por mim em relação com o princípio supremo da moralidade”. O fim que se espera com determinada ação não pode ser diferente da própria ação em si mesma.
Para Kant, virtudes como amabilidade, gentileza, cortesia, são deveres para com os outros regidos por uma lei moral que manda “imperativamente em mim”. O homem deve ser um fim em si mesmo, “devemos nos interessar pelos fins dos outros, desde que sejam morais, buscando a felicidade do outro”.
“O exercício dos deveres de virtude (éticos) como uma obrigação para com os outros possibilita, na sua realização, uma comunidade ética de afabilidade, cooperação, cortesia, gentileza gratuita.” Contudo, essas ações virtuosas precisam ser verdadeiras, sinceras, pois a lei que me manda agir deve ser moralmente reconhecida num sentimento de respeito e não como resultado do desejo.


Kant afirma que mesmo a mera ação da elegância do ato da hospitalidade, pode tornar o exercício da virtude um hábito que favoreça o desenvolvimento moral, já que as ações externas se concretizam na realização das instituições, como a institucionalização da hospitalidade. No entanto, Kant reconhece que não devemos mentir, “a obrigação moral que o sujeito tem com relação à hospitalidade não pode contradizer a obrigação moral que tem de dizer a verdade”. “Quando a razão nos obriga a obedecer a lei incondicionalmente nos exige obedecer a lei da razão e não qualquer lei nem de qualquer maneira”, pois a ação deve permear uma lei moral que imponho a mim mesmo. As ações devem ser conduzidas para o campo racional do imperativo categórico que caminha na contramão do desejo e da irracionalidade, já que é uma ação que exige do agente uma postura consciente.

PARTE V - O DEVER JURÍDICO DA HOSPITALIDADE KANTIANA – CONDIÇÃO PARA A PAZ DURADOURA



Para Kant a hospitalidade consiste num modo de se viver juntos. Uma noção de tolerância capaz de evitar conflitos e até mesmo guerras. Para o filósofo a construção da hospitalidade se dá no momento em que se entende que não existe “posse comum”, mas sim, o direito de visita “que a todos os homens assiste” (KANT, 1993).
A hospitalidade transparece quando o direito de alguém chegar de outro território é resguardado e o mesmo pode apresentar-se em sociedade sem hostilidade ou constrangimento.
Segundo o referido filósofo a hospitalidade torna-se “o direito de alguém ir, vir, estar em algum lugar e poder cuidar da própria vida” (pg. 10). É o início nato da liberdade.
O estabelecimento da paz entre Estados e  povos depende da hospitalidade no sentido jurídico delimitada por Kant. Esta hospitalidade não diz respeito somente a uma certa região, mas sim, ao contexto global, no qual as pessoas tornam-se cidadãos do mundo.
Kant acredita que a paz mundial pode ser resultado da hospitalidade entre povos de diferentes países e que esta é benéfica tanto para quem é acolhido e para quem acolhe.
O filósofo adiantou-se no tempo e alertou para os grandes problemas que a falta de hospitalidade poderiam gerar como a divisão de territórios, guerras, invasões militares causando “a negação da moralidade, a negação da própria humanidade... o desastre moral. A hospitalidade traduz-se no acolhimento dos imigrantes. O encontro com o outro diferente e pela acolhida da diferença” (pg. 12).
A hospitalidade, segundo Kant é o exercício da razão prática e que pode levar à construção da paz entre os povos. Torna-se um direito e um dever de todos.
A leitura do texto torna-se muito atual, principalmente, quando se vê tantas pessoas deixando seus países e procurando abrigo em outros, e muitas vezes, não são acolhidos. São abandonados à própria sorte. Infelizmente o alerta de Kant tem cada vez mais se fazendo presente em nosso meio.

As migrações tem acontecido de maneira mais forte na Europa, porém, em todos os continentes há esta prática, inclusive no Brasil, pois as pessoas buscam melhores condições de vida em outras cidades, quando não podem viver dignamente em seu lugar de origem.

PARTE VI - CONSIDERAÇÕES


O termo hospitalidade, portanto, pode ter várias definições, uma vez que está associado, em sua raiz ao termo hostilidade.
A hospitalidade pode ter seu sentido atribuído à própria acolhida de pessoas quaisquer quanto às normas de etiqueta de um certo lugar.
Em resumo, e objetivo dessa discussão, a hospitalidade está na compreensão das relações com o outro que é diferente e a acolhida dessa diferença bem como os sentimentos que lhes são atribuídos: estranhamento, familiaridade, dever, reconhecimento da diferença, relação de troca, gratuidade, etc.
Kant traz a relação da hospitalidade com a razão prática: uma relação com o outro que implica um dever moral, pautado no funcionamento da própria razão. Por outro lado, nos apresenta a hospitalidade dentro dos aspectos jurídico-políticos se resumem no caminho para a paz duradoura.
O estrangeiro para Kant é sempre o outro, independente de sua origem territorial, devendo ser tratado como pessoa, como fim em si mesmo e não apenas como meio.
A semana nos trouxe uma reflexão que, diga-se de passagem, deve ser constante, sobre as diferenças e o nosso trato em relação a essa temática. Como reagimos com o que é diferente? Diferente de nós ou para nós?  
O modo como reconhecemos a diversidade, a nossa conduta com o outro mostra a nossa verdadeira face. Qual o nosso conceito de hospitalidade?
Para reagirmos um pouco mais, abaixo o link de uma reflexão iniciada com as migrações, os refugiados e relação com o Mito da Hospitalidade, resquício da Cultura grega...

https://leonardoboff.wordpress.com/2015/10/02/o-mito-da-hospitalidade-e-os-refugiados-de-hoje/