segunda-feira, 18 de abril de 2016

SEMANA 3

A VIRTUDE DA RAZÃO PRÁTICA

Nessa semana foi abordada a relação entre a virtude ética e a virtude dianoética, a primeira correspondente a parte irracional da alma responsável pelo desejo, e que necessita da intervenção constante da razão, e a segunda relativa a excelência da função exercida pela parte racional da alma que visa a utilidade prática da ação.

A atividade proposta nessa semana foi o fichamento do livro VI da Ética a Nicômaco. Nesse livro Aristóteles trata da essência da virtude moral como a justa medida ou justo meio, que consiste na harmonia ou equilíbrio entre dois extremos: a falta e o excesso. Ele destaca que para se alcançar tal equilíbrio devemos cultivar bons hábitos, os quais, por meio da razão, nos conduzirão a justa medida no que concerne aos anseios despertados pelas emoções.   

 


A seguir o fichamento do livro VI da Ética a Nicômaco que ilustra esse Pensamento:

ARISTÓTELES, Ética a Nicômaco, tradução e notas: Luciano Ferreira de Souza. São Paulo: Martin Claret, 2015.




1-  [...] existe um determinado fim para o qual, [...], visa o homem que possui a razão correta, [...] e existe um princípio que determina os meios-termos, que dizemos ser um estado intermediário entre o excesso e a falta, pelo fato de estar em conformidade com a razão correta. [...] em tudo o que é objeto da ciência, [...] não devemos empregar ou diminuir o nosso esforço, [...] mas de modo mediano, e isso como pede a razão correta; [...]. (pág.153)

2-  Anteriormente dissemos que havia duas partes da alma, a saber, a parte racional e a parte irracional. [...] as partes racionais são duas, uma pela qual contemplamos esses tipos de seres cujos princípios podem ser diferentes do que eles realmente são, e outra pela qual nós conhecemos as coisas contingentes; quando, de fato, os objetos diferem em gênero, as partes da alma adaptadas naturalmente ao conhecimento uns dos outros devem também diferir em gênero, se é verdade que é por certa semelhança e afinidade entre o sujeito e o objeto que se encontra o conhecimento. Chamemos uma delas de parte científica, e a outra de calculativa, pois deliberar e calcular são o mesmo, [...] a parte calculativa é somente uma parte racional da alma. [...] a virtude de uma coisa é relativa ao seu próprio funcionamento.
Ora, existem na alma três fatores predominantes que determinam a ação e a verdade: sensação, intelecto e desejo. Desses fatores, a sensação não é o princípio de nenhuma ação [...].
A afirmação e a negação estão no pensamento e correspondem à busca e à aversão no domínio do desejo; [...] portanto, que a razão seja verdadeira e o desejo correto, se a escolha é realmente boa, e que exista identidade entre o que a regra afirma e o que o desejo busca. (pág. 154)

3-  [...] o pensamento contemplativo, que não é nem prático nem produtivo, seu estado bom e mau consiste no verdadeiro e no falso [...] enquanto a parte do intelecto prático, seu bom estado consiste na verdade que corresponde ao desejo, ao desejo correto.
O princípio da ação é assim uma escolha [...] o princípio da escolha é o desejo e a razão dirigida para algum fim. [...] a escolha não pode existir nem sem o intelecto e pensamento, nem sem uma disposição moral, pois as boas e más ações não existem sem pensamento e sem caráter. (pág. 155)

4-  [...] as duas partes intelectuais da alma tem por função a verdade.
[...] O objeto do conhecimento científico existe então necessariamente, e ele é eterno, pois coisas que existem por uma necessidade absoluta são todas eternas.
Além disso, considera-se que toda ciência é suscetível de ser ensinada, e que seu objeto pode ser aprendido. Mas todo ensinamento dado vem de conhecimentos preexistentes, [...]. (pág. 156)

5-  [...] um homem tem conhecimento científico quando tem sua convicção estabelecida de certa maneira, e que os princípios lhe são familiares [...].
[...] Produção e ação são distintas [...], de modo que a disposição para agir, acompanhada de razão, é diferente da disposição para produzir acompanhada de razão. [...] nem a ação é uma produção, nem a produção uma ação.
Toda arte diz respeito sempre a uma geração, a um aplicar-se em inventar e considerar, de modo a dar existência a alguma coisa que é suscetível de existir ou não, mas cujo princípio de existência reside em quem produz, e não no que é produzido. (pág. 157)

6-  [...] é necessário que a arte surja da produção e não da razão; [...].
[...] Parece que é próprio de um homem dotado de sabedoria prática ser capaz de deliberar corretamente sobre o que é bom e vantajoso para si mesmo, não de uma parte, [...], mas de uma maneira geral, quais tipos de coisas, por exemplo, conduzem para uma vida feliz.
[...] possui sabedoria prática aquele que é capaz de deliberação. [...] (pág. 158)

7-  [...] dotados de sabedoria prática, [...] possuem a capacidade de ver as coisas boas por si mesmas e o que é bom para os homens, e tais são também, pensamos, as pessoas que se dispõem para a administração de uma casa ou de uma cidade. [...]
[...] os princípios de nossas ações consistem no fim para o qual tendem nossos atos; mas ao homem corrompido pelo prazer ou pela dor, o princípio não se mostra de modo imediato, e ele é incapaz de ver, por isso, qual fim ele deve escolher e realizar aquilo que escolhe, pois o vício é destrutivo do princípio. A sabedoria prática deve, [...] ser necessariamente uma capacidade acompanhada de razão verdadeira, capaz de agir no que diz respeito aos bens humanos. [...] existe uma virtude na arte, mas não na sabedoria da prática; na arte, é preferível o homem que erra voluntariamente, enquanto que na sabedoria prática, assim como em relação às outras virtudes, é o inverso que ocorre.
[...] a sabedoria prática é uma virtude e não uma arte. [...]. (pág. 159)

8-  [...] a razão intuitiva que apreende os primeiros princípios.
[...] não queremos dizer por sabedoria nada além do que a excelência em uma arte. [...] (pág. 160)


9-  [...] a sabedoria, dentre as formas de saber, é a mais perfeita. [...] a sabedoria será a combinação de razão intuitiva e conhecimento científico, ciência que possui a parte mais nobre das coisas mais dignas de honra.
[...] a sabedoria filosófica é ao mesmo tempo conhecimento científico e razão intuitiva das coisas que são, por natureza, as mais elevadas. [...]. (pág. 161)

10-        [...] a sabedoria prática relaciona-se às coisas humanas e às coisas que admitem deliberação, pois o homem dotado de sabedoria prática, dizemos, tem por obra principal o bem deliberar; [...]. O bom deliberante, no sentido absoluto, é o homem que se esforça, racionalmente, para atingir o melhor dos bens realizáveis pelo homem.
A sabedoria prática não se ocupa somente das coisas universais, mas ela deve ter também o conhecimento dos fatos particulares, pois ela é de ordem prática, e a ação se relaciona com as coisas particulares. [...]
[...], sabedoria prática é de ordem da ação, de modo que deveríamos possuir as duas espécies de sabedoria e, de preferência, mais a segunda do que a primeira. [...]. (pág. 162)

11-        [...] a sabedoria prática também se identifica especialmente com aquelas formas no que diz respeito à própria pessoa, isto é, um indivíduo; [...].
[...] aquele que conhece seus próprios interesses e com eles se ocupa, é um homem dotado de sabedoria prática, [...]. (pág.163)

12-        [...] não parece existir um homem jovem dotado de sabedoria prática. A causa disso é que tal sabedoria tem relação não só com os universais, mas também com os particulares, que se tornam familiares somente por experiência – experiência que o jovem não possui – pois é pela força do tempo que se adquire experiência. [...]
Que a sabedoria prática não é conhecimento científico, isso é uma coisa manifesta. Ela se ocupa, de fato, sobre o que há de mais particular, como já foi dito, pois a ação a ser realizada é ela mesma particular. Ela, portanto, se opõe à razão intuitiva, [...] enquanto que a sabedoria prática se relaciona com o que existe de mais individual, o qual não é objeto de conhecimento científico, mas da percepção, e não da percepção das qualidades sensíveis, mas uma percepção daquela natureza pela qual nós percebemos que tal figura particular é um triângulo, pois nessa direção e na premissa maior existe um limite. [...] (pág. 164)

13-        [...] a boa deliberação é uma forma de investigação, e aquele que delibera investiga e calcula. [...] a deliberação exige muito tempo, [...].
[...] a boa deliberação é um tipo de correção, [...].
[...] que ela seja correção do raciocínio, pois ele não é ainda uma asserção, [...] e o homem que delibera, quer delibere bem, quer delibere mal, busca alguma coisa e calcula. (pág. 165)

14-        [...] os homens dotados de sabedoria prática têm por característica o fato de ter deliberado bem, a boa deliberação será a correção no que diz respeito ao que é útil para a realização de um fim, utilidade cuja verdadeira concepção é a sabedoria prática em si. (pág. 166)

15-        [...] A sabedoria prática é, de fato, diretiva (pois ela tem por fim determinar o que é nosso dever fazer ou não fazer), enquanto que a inteligência é somente judicativa. [...].
A inteligência não consiste nem em possuir a sabedoria prática, nem em adquiri-la. [...]
O que é chamado, enfim, discernimento, [...] é a discriminação correta do que é equitativo. [...] E o discernimento é o que aprecia corretamente o que é equitativo; e o discernir corretamente é julgar conforme a verdade. (pág. 167)

16-        [...] ser um homem inteligente ou de discernimento bom e humano consiste em ser capaz de julgar as coisas que entram no domínio da sabedoria prática, enquanto as equidades são comuns a todas as pessoas de bem em suas relações com o outro.
[...] os casos particulares servem de ponto de partida para atingir as coisas universais. Nós devemos, porém, ter uma percepção dos casos particulares, e essa percepção é razão intuitiva. [...] Por isso a razão intuitiva é ao mesmo tempo princípio e fim, coisas que são ao mesmo tempo origem e objeto das demonstrações. [...] (pág. 168)

17-        [...] A sabedoria teórica, de fato, não estuda nenhum dos meios que podem tornar um homem feliz, já que ela não diz respeito ao devir. A sabedoria prática, por outro lado, preenche bem esse papel, [...]. (pág.169)

18-        [...] a sabedoria filosófica produz a felicidade, pois sendo uma parte da virtude total, é pela simples possessão e pelo seu exercício que ela torna o homem feliz.
[...] a própria alma do homem só é completa quando está em conformidade com a sabedoria prática, assim como com a virtude moral; a virtude moral, com efeito, assegura a exatidão do fim que perseguimos, e a sabedoria prática, aquela dos meios para alcançar esse fim. [...]. (pág. 170)
19-        [...] para ser um homem bom, é necessário ter uma certa disposição quando pratica cada uma dessas ações, isto é, eles devem ser feitos por escolha deliberada, e em vista das próprias ações que são realizadas.
[...] a impossibilidade de se possuir sabedoria prática sem ser virtuoso.
[...] O caso da virtude é, de fato, análogo ao da sabedoria prática em relação à habilidade. [...]. (pág. 171)

20-        [...] do mesmo modo que para a parte que opina se distinguem dois tipos, a habilidade e a sabedoria prática, na parte moral também haverá dois tipos, a virtude natural e a virtude propriamente dita, e dessas duas virtudes a virtude propriamente dita não é produzida sem ser acompanhada de sabedoria prática. [...]. (pág. 172)

21-        [...] não é possível ser um homem bom no sentido estrito, sem a sabedoria prática, nem possuir tal virtude sem a virtude moral. [...]. (pág. 173)


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