quinta-feira, 16 de junho de 2016

SEMANA 4 - A REVOLUÇÃO CARTESIANA

A REVOLUÇÃO CARTESIANA



Descartes é o primeiro filósofo moderno que centraliza o pensamento dando importância ao sujeito, um sujeito que se desprende da natureza a agora consegue se enxergar no mundo, mas que precisa de uma certeza.

Ele coloca em dúvida o mundo objetivo, externo ao sujeito, através da dúvida metódica, que questiona as "racionalidades insubmissas ao modelo matemático”, a fim de superar continuamente a dualidade corpo e alma.

A partir do "Penso, logo existo”, Descartes propõe uma solução para a questão da certeza quanto à própria existência humana, pois no momento em que estou pensando não posso duvidar de que existo.

No pensamento do filósofo o sujeito passa a ter uma grande importância na busca das respostas quanto às verdades do mundo. Para tanto a matemática torna-se um elemento fundamental na compreensão da natureza, que passa a ser representada a partir da forma matemática, além da retomada do platonismo.

Há uma busca pelo desvelar do sujeito ao se mostrar livre frente ao "reino da necessidade” representado pela natureza, pois aquele se contrapõe a este para estabelecer sua liberdade.

Nos estudos de anatomia do corpo humano, Descartes busca a compreensão do movimento, que o leva a conceber o homem como homem-máquina, em uma visão mecanicista que vê o corpo humano como uma máquina, pois para ele a única diferença entre o homem e um relógio está na força que os move, enquanto o relógio é movido por uma força externa a ele, o homem possui dentro de si a sua força motriz, ou seja, o ser pensante que não está presente no mundo físico.

Descartes também diferencia o corpo da alma, o corpo é a matéria física e a alma a matéria pensante, contudo ambos se relacionam a fim de compor uma mesma coisa, o ser humano. O filósofo traz uma nova perspectiva de homem e mundo, para ele o homem encontra-se só na imensidão do Universo, em uma compreensão de um Cosmos ordenado por leis físicas e matemáticas.
Kerly Nunes de Souza

A necessidade de explicar o mundo está presente em todas as épocas da humanidade. O que se altera é a forma como essa busca foi processada em cada período. Para os modernos, o conhecimento é relacionado não apenas com o sujeito que pensa, mas diz respeito à sua atuação prática na realidade.

Surge nesse sentido, dois modelos de conhecimento: o empirismo, em que as ideias são provenientes dos sentidos, das experiências e sensações e o racionalismo, em que o verdadeiro conhecimento é aquele que for logicamente necessário e válido.

Nesta última corrente filosófica, René Descartes (1596-1650) apresenta-se com grande destaque. Seu principal objetivo era revisar sistematicamente todos os seus conhecimentos à procura de toda forma de dúvida e/ou certezas inabaláveis, na tentativa de construir uma nova ciência. Esse método, desenvolvido por ele  foi o método da dúvida metódica.  Em suas conclusões, o fato do pensar jamais poderia duvidar, sendo esta a única certeza matemática de que dispunha e base sustentável para a construção do saber. O método para Descartes é, portanto, a forma de se chegar às verdades e a razão é a maneira de organizar a realidade para que essa se torne compreensível.

Em sua obra "Discurso do método”, descreveu detalhadamente os passos que o levaram à fundação de seu método, caminhando da dúvida sistemática à certeza da existência de um sujeito pensante - o cogito. O sujeito passa a pensar e questionar tudo o que está ao seu redor, a si mesmo e para além de si: a vida.




Seu pensamento causou uma reviravolta epistemológica, inovações e incertezas abalaram a visão cosmológica do homem e centraliza-se o olhar no conhecimento a partir do próprio homem, é claro que esse racionalismo trouxe consequências como a fragmentação do saber, impactos na concepção da natureza, mas nos permite dizer que foi um grande avanço para o desenvolvimento tecnocientífico moderno.

Lendo e vasculhando o material, encontrei um trecho do "Discurso do método", de Descartes em que ele diz o seguinte:

" Concluo justamente que minha essência consiste nisto apenas, que eu sou uma coisa pensante [...] E no entanto, talvez [...] tenho um corpo ao qual estou estreitamente ligado, tenho, de um lado, uma ideia clara e definida de mim mesmo como uma coisa pensante, não extensa, e, de outro lado, uma ideia nítida de meu corpo como uma coisa extensa e não pensante; é certo, portanto, que sou realmente algo distinto de meu corpo e não posso existir sem ele."

Esse trecho sistematiza a existência de uma dicotomia alma/corpo, espírito/matéria e uma percepção da extensão da realidade: objetividade/subjetividade, nos permitindo refletir sobre a existência de uma verdade absoluta quando desconhecemos toda a nossa essência...

O mecanicismo se apresenta como uma teoria que acredita que o Universo se comportava como uma grande máquina, em que tudo podia ser conhecido, ou seja, suas causas, objetivos, uma grande previsibilidade se apresentava por meio da análise das partes que o compõe, teoria essa que ainda exerce grande influência no conhecimento científico, afinal, este é aquele que pode ser medido, quantificado, decomposto em partes mais simples e estudado para entender como funciona o conjunto.

O determinismo científico, teoria originada do mecanicismo, trouxe ainda a ideia de que a natureza estava diretamente relacionada às regras, e estas, compunham o Universo e podiam ser percebidas pelo uso da razão.

Assim como trouxe em discussão o colega Nivaldo, se conhecêssemos as forças da natureza e o próprio Universo em suas partículas, talvez fosse possível expressar em fórmula, segundo o entendimento dessa teoria, o movimento de tudo. John Locke, Augusto Comte foram alguns influenciados por essas ideias...

Sobre Descartes, ao entender o homem como ser pensante e matéria, substância, ele entende o homem como integrante do mundo físico, do Universo e, como parte integrante do mesmo, o vê como uma grande máquina. Essa visão dualista o fez refletir sobre o funcionamento do mundo pôs a natureza a favor dessa mecanização, afinal, tudo está interligado nessa grande máquina.

Sobre essa relação, encontrei esse trecho de Ferdinand Al Quié(1987) que traduz o pensamento como ligação entre as partes, favorecendo a relação homem x mundo, no mecanicismo:

Relógios e órgãos são bem semelhantes, assim como nervos e tubos. A água que brota das fontes pode mover máquinas ou pronunciar palavras. As molas se armam como tendões. Contudo, é pelo pensamento que o homem compreende a máquina, tanto o seu corpo quanto a mecânica do mundo. Pensando que o corpo é a máquina integrada na grande máquina do Universo, o homem assegura a sua dignidade.
AL QUIÉ, Ferdinand. Descartes e o mecanicismo. São Paulo: Global, 1987.



A seguir ficha de leitura do capítulo 6 do texto de René Descartes “O Discurso do Método”:


FICHA DE LEITURA DO CAPÍTULO 6 DA OBRA “O DISCURSO DO MÉTODO” DE RENÉ DESCARTES

DESCARTES, René. Discurso do Método, tradução de: Enrico Corvisieri. Versão eletrônica do livro “Discurso do Método”. Créditos da digitalização: Membros do grupo de discussão Acrópolis (Filosofia). Homepage do grupo: http://br.egroups.com/group/acropolis/

 [...]
1-    Jamais dei muita atenção às coisas que provinham de meu espírito, e, à medida que não colhi outros frutos do método que emprego, exceto que fiquei satisfeito em relação a algumas dificuldades que dizem respeito às ciências especulativas, ou então que tentei pautar meus hábitos pelas razões que ele me ensinava, não me considerei obrigado a nada escrever acerca dele. Pois, no que se refere aos hábitos, cada qual segue de tal maneira sua própria opinião [...] apenas adquiri algumas noções gerais concernentes a física, e, começando a comprová-las em várias dificuldades particulares, percebi até onde podiam conduzir e quanto diferem dos princípios que haviam sido utilizados até o presente, considerei que não podia mantê-las escondidas sem transgredir a lei que nos obriga a procurar, no que depende de nós, o bem geral de todos os homens. Pois elas me mostraram que é possível chegar a conhecimentos que sejam muito úteis à vida, e que, em lugar dessa filosofia especulativa que se ensina nas escolas, é possível encontrar-se uma outra prática mediante a qual, conhecendo a força e as ações do fogo, da água, do ar, dos astros, dos céus e de todos os outros corpos que nos cercam [...] poderíamos utilizá-los da mesma forma em todos os usos para os quais são próprios, e assim nos tornar como senhores e possuidores da natureza. [...] para a conservação da saúde, que é sem dúvida o primeiro bem e a base de todos os outros bens desta vida; pois mesmo o espírito depende tanto do temperamento e da disposição dos órgãos do corpo que, se é possível encontrar algum meio que torne comumente os homens mais sábios e mais hábeis do que foram até aqui, creio que é na medicina que se deve procurá-lo. [...] tendo a intenção de empregar toda a minha vida na pesquisa de uma ciência tão necessária, e havendo encontrado um caminho que se me afigura tal que se deve infalivelmente encontrá-la, se o seguirmos [...] julguei que não havia melhor remédio contra esses dois impedimentos a não ser comunicar com fidelidade ao público o pouco que já tivesse descoberto, e convidar os bons espíritos a empregarem todas as forças para ir além, contribuindo, cada qual de acordo com sua inclinação e sua capacidade, [...] somando as vidas e os trabalhos de muitos, fôssemos, todos juntos, muito mais longe do que poderia ir cada um em particular. Pág 34 e 35

2-    [...] a respeito das experiências, que elas são tanto mais necessárias quanto mais avançados estivermos no conhecimento. Pois, no início, mais vale servir-se apenas das que se apresentam por si mesmas aos nossos sentidos, e que não poderíamos ignorar, desde que lhes dediquemos o pouco que seja de reflexão, em vez de procurar as mais raras e complicadas: a razão disso é que essas mais raras muitas vezes nos enganam, quando se conhecem ainda as causas das mais comuns, e que as circunstâncias das quais dependem são quase sempre tão específicas e tão pequenas que é muito penoso notá-las. [...] procurei encontrar os princípios, ou causas primeiras, de tudo quanto existe, ou pode existir, no mundo, sem nada considerar, para tal efeito, senão Deus, que o criou, [...] examinei quais são os primeiros e os mais comuns efeitos que se podem deduzir dessas causas [...] quando quis descer às que eram mais específicas, apresentaram-se-me tão variadas que não acreditei que fosse possível ao espírito humano distinguir as formas ou espécies de corpos que existem sobre a Terra, [...] a não ser que se busquem as causas a partir dos efeitos e que se recorra a muitas experiências específicas. [...] o poder da natureza é tão amplo e tão vasto e que esses princípios são tão simples e tão gerais que quase não percebi um único efeito específico que eu já não soubesse ser possível deduzi-lo daí de várias formas diferentes, e que a minha maior dificuldade é comumente descobrir de qual dessas formas o referido efeito depende. Pág. 35 e 36

3-    [...] ocorreram outras razões que me fizeram mudar de opinião e pensar que devia continuar escrevendo todas as coisas que considerasse de alguma importância, [...] para ter mais oportunidades de melhor analisá-las, porque não há dúvida de que se tem mais cuidado com o que pensamos que deva ser visto por muitos, do que com o que se faz apenas para si próprio [...] apesar de ser verdade que cada homem deve procurar, no que depende dele, o bem dos outros, [...] é verdade também que os nossos cuidados devem estender-se para mais longe do tempo presente, [...] quero que se saiba que o pouco que aprendi até agora não é quase nada em comparação com o que ignoro, e que não desanimo de poder aprender; [...]. Pág 36 e 37

4-    [...] apesar de reconhecer que sou muito sujeito a falhas, e que quase nunca me fio nas primeiras idéias que me ocorrem, a experiência que possuo acerca das objeções que me podem ser feitas impede-me de esperar delas qualquer proveito: [...] raramente aconteceu que alguém me objetasse algo que eu já não tivesse previsto, salvo se fosse coisa muito afastada de meu assunto; de maneira que quase nunca deparei com algum crítico de minhas opiniões que não me parecesse ou menos rigoroso ou menos equilibrado do que eu mesmo. [...] Pág 38

5-    A respeito da utilidade que os outros obteriam da divulgação de meus pensamentos, não poderia também ser muito grande, sendo que ainda não os levei tão longe que não seja necessário acrescentar-lhes muitas coisas antes de aplicá-los ao uso. [...] porque não se pode compreender tão bem uma coisa, e torná-la nossa, quando a aprendemos de outrem, como quando nós mesmos a criamos. [...] jamais acreditem nas coisas que lhes forem apresentadas como provindas de mim, se eu mesmo não as tiver divulgado. [...] e tenho certeza de que os mais apaixonados dos atuais partidários de Aristóteles sentir-se-iam felizes se tivessem tanto conhecimento da natureza quanto ele o teve, apesar de sob a condição de nunca o terem maior. [...] o modo de filosofar é muito cômodo para aqueles que possuem espíritos bastante medíocres; pois a falta de clareza das distinções e dos princípios de que se utilizam é causa de que possam falar de todas as coisas tão ousadamente como se as conhecessem, e sustentar tudo o que dizem contra os mais perspicazes e os mais capazes sem que haja meio de persuadi-los. [...] se almejam falar de todas as coisas com conhecimento e obter a fama de sábios, irão consegui-lo mais facilmente satisfazendo-se com a verossimilhança, que pode ser encontrada sem muito esforço em todas as espécies de matérias do que procurando a verdade, que só se descobre pouco a pouco em algumas, e que, quando se trata de falar das outras, obriga a confessar sinceramente que nós as ignoramos. Dado que preferem o conhecimento de um pouco de verdade à vaidade de darem a impressão de nada ignorar, [...] o que ainda me falta descobrir é em si mais difícil e mais obscuro do que aquilo que pude anteriormente encontrar, [...] a partir da juventude me tivessem ensinado todas as verdades cujas demonstrações procurei depois, e se eu não tivesse dificuldade alguma em aprendê-las, talvez nunca soubesse algumas outras, e ao menos nunca teria adquirido o hábito e a facilidade, que julgo possuir, para sempre descobrir outras novas, conforme me esforço em procurá-las. [...] Pág 38, 39 e 40

6-    [...] se houvesse no mundo alguém de quem se soubesse que seria com certeza capaz de encontrar as maiores coisas e as mais úteis possíveis para o público, e a quem, por esse motivo, os demais homens se esforçassem, por todos os meios, em ajudar na realização de seus intentos, não vejo que pudessem fazer mais por ele além de financiar as despesas nas experiências de que precisasse e, de resto, impedir que seu tempo lhe fosse tomado por pessoas inoportunas. [...] Pág. 40

7-    [...] houve novamente duas outras razões, que me obrigaram a apresentar aqui alguns ensaios particulares, e a prestar ao público alguma conta de minhas ações e de meus intentos. A primeira é [...] jamais procurei esconder minhas ações como se fossem criminosas, [...] haver-me sempre mantido assim indiferente entre o cuidado de ser conhecido e o de não sê-lo, não pude evitar de adquirir certa reputação, julgando que devia fazer o máximo para me livrar ao menos de tê-la má. A outra razão [...] não quero faltar tanto a mim próprio que dê motivo aos que me sobreviverão para me censurar um dia de que eu poderia ter-lhes legado muitas coisas bem melhores do que as que leguei, se não me tivesse descuidado tanto em fazê-los compreender em que poderiam contribuir para os meus projetos. Pág. 41

8-    [...] como a experiência torna a maioria desses efeitos muito correta, as causas das quais os deduzo não servem tanto para prová-los ou explicá-los, mas, ao contrário, são elas que são provadas por eles. [...]. Pág. 42

9-  [...] E se escrevo em francês, que é o idioma de meu país, e não em latim, que é o de meus mestres, é porque espero que aqueles que se servem somente de sua razão natural totalmente pura julgarão melhor minhas opiniões do que aqueles que só acreditam nos livros antigos. [...]. Pág. 42


10- [...] decidi não empregar o tempo de vida que me resta em outra coisa que não seja tentar adquirir algum conhecimento da natureza, que seja de tal ordem que dele se possam extrair normas para a medicina, mais seguras do que as adotadas até agora; [...] ficarei sempre mais agradecido àqueles em virtude dos quais desfrutarei sem estorvo do meu tempo, do que o seria aos que me oferecessem os mais dignificantes empregos do mundo. Pág. 43

CONSIDERAÇÕES:
O método científico, para Descartes, é a maneira pela qual o homem poderá dominar a natureza, e para tanto se faz necessário o uso da física e da matemática para explicar seus fenômenos.
Descartes valoriza o uso do pensamento matemático sobre a lógica para alcançar uma nova expressão da natureza, a fim de explicá-la e manipulá-la. A matemática se apresenta como condição de pensamento para se alcançar a certeza e evidência dos raciocínios.
O pensamento metafísico é abandonado, Descartes propõe um novo olhar diante do mundo, que nega os valores clássicos e estabelece uma nova relação homem e natureza.       



  

Assista conosco a vídeo aula da semana 4: http://videos.ufes.br/video/0_dd6qg8y1

Nenhum comentário:

Postar um comentário