quinta-feira, 24 de setembro de 2015

A FILOSOFIA POLÍTICA DA GRÉCIA ANTIGA COMO INSPIRAÇÃO PARA O ATUAL DEBATE SOBRE O ENSINAR A FILOSOFAR

Semana 6

Na semana 6 foi a vez de discutirmos sobre as concepções político-pedagógicas das Orientações Curriculares para o Ensino Médio elaboradas pelo MEC e a forma como a filosofia é ensina no Ensino Médio.
Para entendermos um pouco mais, foi-nos apresentado o Conteúdo Básico Comum - CBC  de Filosofia da rede de Ensino Estadual do Espírito Santo. É um documento norteador da educação que compartilha, além dos conteúdos e suas respectivas séries de ensino, competências e habilidades que devem ser desenvolvidas e privilegiadas no ensino do Filosofia, além de estratégias e material de apoio para que isso aconteça.

Para a prática, um plano de aula com base no CBC do Espírito Santo foi elaborado por cada um de nós, com temas à escolha para sermos avaliados quanto ao desenvolvimento da Filosofia para a formação de alunos em cidadãos críticos e responsáveis pela sociedade.

Assistam conosco a importância o ensino da Filosofia:


A CONTROVÉRSIA ENTRE SOFISTAS E FILÓSOFOS

Semana 4



Quando a filosofia de Platão aparece há um rompimento com a visão mitológica de mundo.
Não há mais o discurso do autoritarismo divino, os deuses dando  ordem aos homens, onde o sacerdote sabe e as pessoas comuns não sabem, calando-se diante deles.
Com Platão a palavra ganha força (teoria) como tentativa de explicar o mundo de maneira objetiva (metafísica).
Na democracia grega todos os homens tinham direito ao uso dessa palavra. Surge na cidade grega o espaço chamado Ágora (local onde as pessoas se juntavam para debater) e a lei e a justiça eram resultado dessa deliberação pública.
Quem usa a razão e a palavra melhor, ou seja, quem argumenta melhor, detém o poder. E pelo fato do debate ser público e aberto a todos os cidadãos, o resultado dessa práxis politica é uma legislação/justiça contextualizada ,ou seja, que reflete a cultura desse povo, suas crenças e sua cosmovisão.
Uma prova de que a Ágora era democrática era que tanto a visão do sofista Protágoras, quanto a do filósofo Platão coexistiam.

O texto termina afirmando que essa justiça democrática dos sofistas deve ser resgatada, contra o monopólio de uma visão cientificista representada pela teoria Platônica, na busca de uma pretensa verdade única.

Assista a webconferência sobre as controvérsias entre filósofos e sofistas:



A JUSTIÇA JUDICIAL DE ARISTÓTELES

Semana 3



No que se refere a justiça distributiva, ante o paralelismo antitético justiça e injustiça, Aristóteles considera a justiça como lado luminoso e a injustiça, como lado sombrio. Nesse sentido, o justo é aquele que submete-se à lei e o injusto aquele que se opõe. A justiça perfeita é aquela em que a ação boa consegue atingir a si próprio e ao próximo.
Seguindo esta linha de raciocínio, considera a injustiça irrestrita aquela ambiciosa, desdobrada como covardia, avareza, irascibilidade. Muitas vezes o ser humano é injusto ao agir instintivamente, por vezes, deixando de ser um animal totalmente racional. Vale lembrar que por vezes, a legalidade pode camuflar uma relação não justa entre as partes.
Para o filósofo, nas relações ganho-ganho, uma vez que se viola o princípio da proporcionalidade geométrica, comete-se injustiça.
Quanto a justiça corretiva, Aristóteles refere-se as relações privadas e vemos uma proporcionalidade aritmética. Cabe a um juiz, como mediador, fazer o equilíbrio entre as partes, decidindo o que for justo com base em princípios neutros e formais. Nesse sentido, não considera justa a reciprocidade exata, mas sim a reciprocidade proporcional. Esta mantem a cidade unida, uma vez que a busca do interesse comum se configura na felicidade da comunidade política.
Sobre comensurabilidade, vale ressaltar que deve-se considerar também, nessas relações de troca, o valor emocional, o valor religioso, o que o dinheiro tem feito há bastante tempo, segundo Aristóteles, sendo este o padrão de troca.
Para o filósofo deve haver uma separação entre a esfera pública e a privada, não podendo confundi-las. Mas houve aqueles que a confundiram muito ao longo da história, como os déspotas, que tratavam seus súditos a partir de um ponto de vista particular, privado, agindo assim, com injustiça. Afinal, concentravam muito poder em suas mãos.
Entre as várias dimensões de justiça, Aristóteles menciona ainda, a separação entre a justiça natural e a justiça legal, respaldadas no sentido da democracia que consequentemente discute e delibera sobre o melhor para a comunidade política, ressaltadas por uma série de opiniões contraditórias.
Só uma ação voluntária qualifica uma ação como justa ou injusta,  ou seja, agir por vontade própria, sem o uso da coerção. Não pode ser considerada natural a deliberação pública, afinal, ela pode ou não ser. Pode haver persuasão, dissuasão e, se é democracia, não se pode prever o resultado.
Ao contrário dos sofistas, Aristóteles acredita que a natureza da racionalidade limita a
deliberação pública, portanto a justiça natural não é convencional como a justiça legal.  Uma ação voluntária pode ser qualificada como justa ou injusta. Ser consciente é ter noção das consequências de suas ações, sendo portanto uma ação moral. Essa compreensão de moralidade marcou o mundo ocidental e continua atual pra muita gente, a exemplo do pecado, que muitos acreditam ser algo errado e mesmo assim, fazem.
Nesse contexto, existiria a possibilidade de alguém agir injustamente em relação a si mesmo? Para Aristóteles a resposta é não, pois isso iria contra a lei da natureza e, desta forma, seria injusto.
Sabendo que equidade é um conceito que se identifica com a justiça e a supera, entendemos que é a correção da justiça legal, preenchendo suas lacunas nos julgamentos. É como uma régua que se adapta às superfícies, usada pelo juiz para medir e julgar as ações humanas.

Lembrando que equitativo e igualitarismo são conceitos diferentes. Justiça, para Aristóteles, seria uma justa relação entre as partes que compõem o ser humano. Sendo assim o suicida, por exemplo, estaria cometendo um crime, por não cumprir suas obrigações políticas perante o Estado, perdendo seus direitos civis. 

Assista também:


quarta-feira, 23 de setembro de 2015

A FORMAÇÃO DO GOVERNANTE EM PLATÃO

Semana 2



O texto da semana trata da visão platônica do governante, ilustrada a partir do mito da caverna que irá nortear a concepção do estadista como administrador público.
Para Platão o futuro governante precisa passar por um processo de educação que o torne ético e sábio. A contemplação da ideia do bem, para o filósofo, é fundamental para que um governante possua uma ação correta tanto na vida privada quanto na pública.  Para ele o verdadeiro político é aquele que se dedica à pesquisa filosófica e conceitual, tornando o exercício da política um ato de gratidão ao Estado ideal que o permitirá ascender até a contemplação da verdade, do bem e do belo.
Platão critica a ocupação de cargos políticos por pessoas que alcançam esse posto através da sedução do discurso persuasivo, que funciona como cortina para impedir que a verdade se revele.
Platão vê a arte da persuasão como uma ferramenta capaz de conduzir os governados ao caminho real e verdadeiro, não devendo ser utilizada como mecanismo de enganação.
Para o filósofo o estadista precisará passar por uma rigorosa formação durante 30 anos, que equilibre teoria e prática, a fim de torná-lo apto para governar.
O estadista, segundo Platão, deve personificar o Estado ideal, cujo coração se destina, não a um cesto de moedas, mas à “ilha das bem-aventuranças”. Toda educação do governante deve ser orientada ao bem em si, sendo ele aquele que investiga a essência da realidade em vista da verdade e do bem em si.

A atividade da semana procurou contextualizar a visão de Platão, fazendo um paralelo com o atual cenário político brasileiro e as consequências de uma ação política corrupta que privilegia os interesses particulares em detrimento dos interesses públicos.

Leia também e dê a sua opinião:
Reportagens a favor da indicação política


Reportagens contra a indicação política



A FILOSOFIA DA DEMOCRACIA DE PROTÁGORAS

Semana 1



No estudo da semana 1, foi apresentada a posição sofística de Protágoras em diálogo com Sócrates sobre a possibilidade de se desenvolver a virtude em cada indivíduo a partir da educação.
No mito e discurso de Protágoras, este faz uso de narrativas míticas e do discurso para provar que a virtude é algo que pode ser ensinado, mas que dependendo da singularidade do caráter da cada um, podem ser alcançados níveis mais ou menos elevados de virtude. Em seu discurso ele aponta a correção como um instrumento de aprendizado, entendendo que se assim não o fosse, não haveria sentido na punição, já que o agir contrário às leis e regras estariam concernentes à própria natureza de cada indivíduo.
Ele entende que a virtude faz parte de cada um e apesar de ser mais aprimorada em uns do que em outros devido aos conhecimentos adquiridos pela cultura, educação e estudos, ainda assim existem condições para que todos participem e discutam sobre aspectos que estão diretamente relacionados à vivência na polis, pois são assuntos que se direcionam ao estado de pertencimento de cada um.  
O texto da semana também tratou da questão relativa ao bom governante que para Platão se expressa na figura do filósofo, e que contraria a existência de um governo democrático, já que as pessoas “comuns” não teriam o conhecimento necessário para se manifestarem em relação ou que é bom ou justo.
Para Protágoras o bom governante é aquele que desenvolveu a arte do bem falar, ou seja, da retórica, ele acredita que todos possuem conhecimentos que são necessários para a vida política, já que esta se encontra intrinsecamente ligada à vida de todos os indivíduos da cidade, portanto um estado democrático se faz coerente a essa postura.

Durante a semana foram apresentados vídeos que discutiam o cenário político brasileiro, também como a postura ignorante de muitos indivíduos em relação a política.

Eis o Mito e discurso de Protágoras trabalhado na wiki da semana:

Sócrates, conversando com Protágoras o inquire à provar que pode ensinar as virtudes. Este, então, pergunta se é para demonstrar com um mito ou como um professor a dar aulas. Como as pessoas presentes são indiferentes, Protágoras se põe narrar o mito da criação do homem e dos outros seres mortais.
Naqueles tempos não existiam os mortais. Os Deuses criaram os homens a partir da terra e do fogo. Os irmãos virtuosos Prometeu ( aquele que prevê) e Epimeteu (aquele que pensa após) deveriam repartir os poderes entre todas as espécies . No entanto, Epimeteu pede para realizar a tarefa sozinho. Prometeu então concorda em inspecionar o trabalho de seu irmão. Epimeteu distribuiu todas as qualidades para os animais irracionais de forma igualitária. Aos pequenos, deu-lhe rapidez; aos fracos, abrigo, aos grandes e robustos, força, mas não rapidez; peles para o frio, cascos para proteger os pés. Uns comeriam vegetais e outros carnes. Às presas foram lhes dado alta taxa de reprodução, aos predadores, baixa. E assim assegurou o equilíbrio entre as espécies, assegurando que nenhuma delas se extinguisse e que sobrevivessem às intempéries.
No entanto, o homem ficara sem nenhum desses poderes. Prometeu, inspecionando a situação, tem pouco tempo para solucionar o problema, visto que havia o tempo certo para o homem. Então rouba a Sabedoria de Hefesto e  Atenas, juntamente com fogo, para que sabiamente pudesse articulá-lo. Ocorre que, mesmo com esses poderes os homens não possuem pelos, cascos nem força. Ainda assim, institucionalizaram a cidade com altares, estátuas, articularam a linguagem, construíram habitações, produziram vestimentas e cultivaram a agricultura. Muitas competências técnicas, porém, não possuindo a política, não poderiam conviver sem se agredirem mutuamente. Zeus, temendo que até o último homem fosse extinto, incube Hermes de levar o respeito e a justiça aos humanos. Seguindo as determinações de Zeus, Hermes distribui igualmente esses atributos entre a espécie humana, pois como disse o Deus dos deuses, um médico basta para muitos profanos, porém, uma cidade se faz de muitos homens, que só permanecem unidos em vida social se possuírem o sentido de respeito e de justiça um pelo outro.
Protágoras afirma a Sócrates ser esse o motivo de que em Atenas os conselhos deliberativos sobre os ofícios
diversos são compostos por poucos cidadãos, enquanto que nas deliberações políticas todos são aceitos a participarem. Protágoras defende que isso ocorre justamente por ser a política um atributo igualmente comum a todos o homens, por natureza, efeito do acaso ou mesmo porque a justiça pode ser ensinada e surge como produto de algo.
Até essa parte do mito, Protágoras provou que a política é inerente à espécie humana, mas ainda restava a parte mais importante para a questão que foi justamente o desafio de Sócrates ao sofista para que esse provasse a possibilidade de se ensinar as virtudes. À partir daqui, Protágoras abandona o mito e passa a usar o discurso para convencer Sócrates. Afirma que as pessoas devem ser ou parecerem virtuosas para serem consideradas normais perante os outros.
Quem dissesse que não era bondoso em praça pública, seria considerado louco. Por outro lado, quando alguém comete um crime brutal é preso e castigado, não pelo ato da vingança irracional, mas para que esse se corrija de seu desvio de caráter ou de comportamento. Além disso, seu castigo serve como exemplo para coibir novos transgressores. Fica evidente a função didática do ponto de vista da virtude, pois a punição não restituiria a norma quebrada, mas educaria o transgressor e a sociedade à observarem as regras da justiça e do respeito mútuo.
Protágoras indaga à Sócrates se a excelência é ensinada ou nata. Ele afirma  ser comum que há filhos de flautistas que são igualmente flautistas, mas que  há também aqueles pais virtuosos em um determinado instrumento e cujos filhos não herdaram o mesmo dom, e o há também o inverso. Os filhos dos mais ricos começam a ter aulas mais cedo e abandonam seus mestres mais tarde, daí serem virtuosos em maior número. Os atenienses já acreditavam que a virtude é algo que pode ser ensinada, para a qual nos preparamos toda a nossa vida. Para provar sua tese de que a virtude pode e é ensinada, Protágoras compara a educação dos jovens à vida social em uma cidade. Quando pequeno, as crianças seriam moldadas pelos pais, professores e pela sociedade, recompensando-os ou punindo-os de acordo com suas ações. Depois de adultos, eles passam a ser educados nas leis da cidade. Interpelando Sócrates, Protágoras fala de como seria o comportamento das pessoas que vivessem sem nenhuma forma de punição. Certamente, virtuosas não seriam.
Protágoras fazendo uso do mito e do discurso prova que a virtude é algo que pode ser ensinado, mas considera que existem níveis mais ou menos elevados de virtude que depende da singularidade do caráter da cada um. Em seu discurso, ele aponta a correção como um instrumento de aprendizado, pois se entendêssemos a virtude como algo inato não faria sentido existir punição para as pessoas que agissem de forma contrária as leis e regras já que essa atitude seria própria da sua natureza.
Em complemento, ainda afirma que por toda a vida busca-se a excelência. Pais, pedagogos, mestres, todos encontram-se empenhados em tornar o cidadão capaz de compreender e viver na pólis, principalmente em sua juventude.
Ainda, ele entende que a virtude faz parte de cada um e apesar de ser mais aprimorada em uns do que em outros devido aos conhecimentos adquiridos pela cultura, educação e estudos, ainda assim há condições para que todos participem e discutam sobre aspectos que estão diretamente relacionados à vivência na polis, pois estão direcionados ao estado de pertencimento de cada um.  


A FILOSOFIA POLÍTICA NA ANTIGUIDADE GREGA

SINTETIZANDO O QUE FOI APRENDIDO, PESQUISADO E DISCUTIDO NOS CINCO MÓDULOS


Introdução

A disciplina de Filosofia Política II procurou, ao longo das semanas, direcionar nossos olhares a uma compreensão dos propósitos que envolveram as discussões políticas da antiguidade grega, colocando as diversas concepções relativas ao governante ideal concebidas por Protágoras, Platão e Aristóteles. Essas discussões continham diversos argumentos que avaliavam a arte de governar e sua importância, além de buscar meios que conduzissem ao caminho mais acertado para a escolha do governante.

Assista conosco a apresentação da disciplina:

http://webconf2.rnp.br/p7qm3zsj1w6/

quinta-feira, 18 de junho de 2015

FILOSOFIA MEDIEVAL - O PAPEL DAS LETRAS NA FORMAÇÃO DO FILÓSOFOS EM JOÃO DE SALISBURY

UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO - UFES
GRADUAÇÃO EM FILOSOFIA
MARIA ELIZABETH RIBEIRO
GISLAYNE DA PENHA CROCE FERREIRA
KERLY NUNES DE SOUZA

1 BIOGRAFIA E CONTEXTO HISTÓRICO

João de Salisbury (1115-1180) nasceu em Salisbury, condado de Wiltshire, na Inglaterra. Passou cerca de doze anos estudando nas melhores escolas e entrando em contato com os mestres mais famosos. Esteve em Paris e depois seguiu para Chartres, onde permaneceu por mais tempo e teve sua formação mais sólida. Lá se interessou pelos problemas especulativos, assimilou a cultura e  abraçou a literatura.
Foi convidado a participar ativamente do clérigo, atuando como secretário do arcebispo de Canterbury, Thomas Becket (1117-1170), ao qual dedicou as obras Metalogicon (A Metalógica) e Polycraticus (O Político) e, que, mais tarde foi assassinado por ordem do rei Henrique II. Depois desse acontecimento, Salisbury retornou à França onde exerceu, ao final de sua vida, o cargo de bispo de Chartres, entre 1176 e 1180.
Foi um homem que conhecia bastante a Antiguidade. Em sua obra Metalógica, defende o estudo da Lógica, da Gramática e da Retórica, ou seja, do Trivium em vista a um personagem fictício, o Cornifício,  que representa estudantes descontentes com a educação da época e solicitam a redução do número de disciplinas. Eles desejavam parecer sábios e não os serem, segundo a obra. A defesa salsburiana era por uma formação sólida, para que os estudantes conseguissem realmente se tornarem sábios e terem sucesso.[1]
A obra Policraticus foi escrita durante o reinado de Henrique II de Anjou, porém, antes das controvérsias sobre a violação das liberdades eclesiásticas praticadas pelo rei que resultaram na morte do arcebispo. Tal obra era um tratado de filosofia política e dialogava sobre a ética na vida política e diversas temáticas como o tiranicídio. Por isso, além de teólogo, Salisbury também foi considerado por alguns como um grande ideólogo e o primeiro medieval a considerar a imagem de um rei instruído, um rei intelectual, preocupado como poder e com o governo.
A obra já apresentava uma linguagem moral e intelectual e além de inaugurar a filosofia política medieval, Salisbury também defende a importância das letras na preservação do conhecimento.



2 O PAPEL DAS LETRAS NA FORMAÇÃO DO FILÓSOFO

2.1 O MÉTODO SALSBURIANO


João de Salisbury, foi um dos mais brilhantes pensadores do século XII, do Renascimento do século XII, em que se estudava muito acerca dos métodos de ensino. O que ele mais defendia, era o método tríade: natureza, memória e razão. Para ele, sem esses três conceitos, os homens não poderiam progredir intelectualmente.
De acordo com o pensador, a natureza nos torna mais perceptíveis e com isso, conserva de forma satisfatória a memória humana.  A razão, por sua vez, examina o que foi percebido pela natureza e decide o que será levado ao pensamento, tendo a função de filtrar o conhecimento.



Primeiro, a natureza excita nossa capacidade de perceber as coisas. Em seguida, custodia essas percepções ao tesouro da memória. Com estudo diligente, a razão então examina o que foi percebido e que  será ou deverá ser recomendado à custódia da memória. Depois do escrutínio da natureza, a razão pronuncia um julgamento verdadeiro e incorruptível acerca dessas coisas.[2]  


Com base nisso, a busca da sabedoria, portanto, estaria no interior de cada indivíduo, que buscaria desenvolvê-la através de leituras e práticas cotidianas.[3]
Sobre leitura, Salisbury, afirmava que a prática e a tentativa da mesma é o que produz a perfeição, pois, no ato de ler, supera-se obstáculos e lapida-se o saber, tornando-o completo e significante.
Utilizando-se corretamente a natureza, a memória, a razão e praticando a leitura, o estudante consegue produzir julgamentos e opiniões consistentes.  Caso rompesse com essa tríade e o ato de ler, contudo, interromperia o ciclo do conhecimento e passaria, apenas, a repetir sem pensar afirmações de intermediários.
Salisbury foi enfático ao registrar que sem a prática habitual dos exercícios gramaticais, das leituras, e dos debates, mesmo os detentores das mais elevadas virtudes intelectuais definhariam. Ainda, deu grande importância à memória, evidenciando a necessidade de tê-la e desenvolvê-la. Para além, tudo que se registra na memória há de se registrar através das letras. Assim como o teor dos conhecimentos eram guardados na memória eles também eram registrados nos livros para que jamais se perdessem.
João de Salisbury enxergava as vias rumo ao conhecimento como uma arte. Arte a ser lapidada a cada dia, com disciplina e método, a fim de alcançar a perfeição de um saber. Aos olhos de João, praticar era a maneira mais eficiente do estudante fixar os conteúdos e avançar nos estudos. [4]
Por ser boa, a natureza humana deveria ser continuamente nutrida para que se desenvolvesse adequadamente. Nutrida com exercícios intelectuais diários, tais como leituras e debates. E todos estes envoltos pelos princípios éticos cristãos, ou seja, ser bom antes de ser douto. [5]
A memória era concebida como uma prática que viabilizava a busca pela essência do conhecimento, um ato de sorver as informações e imprimi-las na alma. Atingida pela essência, o conhecimento se transformava em parte da existência humana.
Salisbury asseverou que o bom uso da palavra (eloquência) separava os sábios dos ignorantes, os humanos das bestas ou “animais brutos”. Estes, por não conhecerem as virtudes e os bens proporcionados pela eloquência, não se entendiam. Sem consenso, por não haver comunicação adequada, perdiam-se e destruíam os símbolos da civilidade humana.[6]


2.2 O USO DAS LETRAS

Para João de Salisbury a chave para a perpetuação da vida humana residia no bom uso da eloquência. Absorvida pelas pessoas, ela tornava a existência humana possível. Sem ela, o homem permanecia no “estado de natureza”, que para ele era a ignorância das palavras e das letras, e estas eram o sustentáculo de uma existência humana civilizada.
Com os antigos e os sábios de seu tempo, João aprendeu a valorizar a eloquência e absorveu a disciplina nos estudos. Ainda com os mesmos, as vantagens do ócio intelectual. Para ele, uma era parte da outra, e estas tornavam o homem cada vez mais conhecedor de si mesmo, ou seja, mais humano.
Através das letras, Salisbury afirmava que as coisas não pereciam com o tempo, elas eram dignas de lembrança e, assim, era permitido que o conhecimento fosse transmitido à posteridade. Como seria possível admirar o passado caso não houvesse os escritores, aqueles que registram a vida e seus acontecimentos? Segundo Salisbury, as letras tem luz que iluminam os feitos dos humanos. [7]
O ensino letrado sempre esteve ligado à Igreja. Antes da existência das universidades, eram os homens da Igreja os responsáveis pela instrução. A Catedral de Chartres foi um desses centros de estudos. Homens como Bernardo de Chartres, (c.1124), Teodorico de Chartres (c.1155) e Gilberto de La Porré (c.1075-1154) deram fama ao notório saber desenvolvido nesse ambiente. Atraíram estudantes de todo o ocidente medieval para participar desse contexto de ensino formal nos rudimentos das letras para os oblatos e aos conversi iletrados ou semiletrados, alguma instrução para que pudessem participar da vida ou, ao menos, da adoração comunitária.[8]


CONSIDERAÇÕES FINAIS

Em meio às críticas e aos seus diálogos, João de Salisbury criou, através de suas obras Metalogicon e Policraticus um debate sobre o saber clássico e sua importância como marca da humanidade. Importando-se com a literatura, as artes, a política e a própria humanidade, conduzindo-os ao empenho pessoal através de um método baseado no Trivium - Gramática, Retórica e Dialética e na sabedoria através da busca pela natureza, pela memória e pela razão.
Para tanto, a prática da leitura e da escrita levam o homem à eloquência, à disciplina, caminho para ser conhecedor de si e do meio.
Essa busca pela sapiência, como descrito por Salisbury, é a busca pela felicidade, e as letras são os feitos mais iluminados do homem, pois registram tudo o que é conhecido, possibilitando á posteridade também conhecer e aprimorar.


REFERÊNCIAS

COSTA,  Ricardo da. Extratos de fontes das “Filosofias Medievais” (sécs. II-XIII) Seleção e notas. UFES, 2007.
COSTA, Ricardo da; SANTOS, Bento Silva. História da Filosofia Medieval. SEAD/UFES. 2015. p.51-80.
DICIONÁRIO ABC. João de Salisbury. Disponível em: http://elmaxilab.com/definicao-abc/letra-j/joao-de-salisbury.php. Acesso em: 10 jun 2015.
LANZIERI JÚNIOR, Carlile. "No tesouro seguro de nossa memória". A memória na concepção de três personagens do século XIII. Notandum, São Paulo/Porto, ano XVIII, n. 37, jan./abr., 2015. p. 29-48. Disponível em: http://www.vivariumhist.com/. Acesso em 05 jun 2015.
________. Sob os olhos dos homens de pedra: a importância do método na educação medieval a partir dos escritos de João de Salisbury. Disponível em: http://www.vivariumhist.com/. Acesso em 05 jun 2015.
PAPA BENTO XVI. Audiência Geral: João de Salisbury. 2009. Disponível em: http://w2.vatican.va/content/benedict-xvi/pt/audiences/2009/documents/hf_ben-xvi_aud_20091216.html. Acesso em 11 jun. 2015.



[1]João de Salisbury é o grande nome filosófico do Renascimento do século XII. Tornou seus escritos literários Metalogicon e Policraticus importantes obras filosóficas e políticas e tinham alto teor crítico.  COSTA, Ricardo da; SANTOS, Bento Silva. História da Filosofia Medieval. SEAD/UFES. 2015.p.51.
[2] JOÃO DE SALIBURY, Metalogicon, Livro I, cap. 11, p. 34. In: LANZIERI JÚNIOR, Carlile. Sob os olhos dos homens de pedra: a importância do método na educação medieval a partir dos escritos de João de Salisbury. Disponível em: http://www.vivariumhist.com/. Acesso em 05 jun 2015.    
[3] O período em questão era marcado pela oralidade. Poucos sabiam ler e escrever e entre aqueles que sabiam, o método era utilizado para suscitar aquilo que se acreditava ser mais importante. Além do que era aprendido em livros buscava-se a tessitura do aprendizado ético e cristão. Os feitos dos iletrados também eram registrados por serem considerados sábios pelas vivências.  LANZIERI JÚNIOR, Carlile. "No tesouro seguro de nossa memória". A memória na concepção de três personagens do século XIII. Notandum, São Paulo/Porto, ano XVIII, n. 37, jan./abr., 2015. p. 36. Disponível em: http://www.vivariumhist.com/. Acesso em 05 jun 2015.
[4] LANZIERI JÚNIOR, Carlile. Sob os olhos dos homens de pedra: a importância do método na educação medieval a partir dos escritos de João de Salisbury. Disponível em: http://www.vivariumhist.com/. Acesso em 05 jun 2015.
[5] LANZIERI JÚNIOR, Carlile. Sob os olhos dos homens de pedra: a importância do método na educação medieval a partir dos escritos de João de Salisbury. Disponível em: http://www.vivariumhist.com/. Acesso em 05 jun 2015.
[6] LANZIERI JÚNIOR, Carlile. Sob os olhos dos homens de pedra: a importância do método na educação medieval a partir dos escritos de João de Salisbury. Disponível em: http://www.vivariumhist.com/. Acesso em 05 jun 2015.
[7] COSTA,  Ricardo da. Extratos de fontes das “Filosofias Medievais” (sécs. II-XIII) Seleção e notas. UFES, 2007.
[8] LANZIERI JÚNIOR, Carlile.Sob os olhos dos homens de pedra: a importância do método na educação medieval a partir dos escritos de João de Salisbury. Disponível em: http://www.vivariumhist.com/. Acesso em 05 jun 2015

FILOSOFIA POLÍTICA - THOMAS HOBBES

UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO - UFES
GRADUAÇÃO EM FILOSOFIA
MARIA ELIZABETH RIBEIRO
GISLAYNE DA PENHA CROCE FERREIRA
KERLY NUNES DE SOUZA

1 INTRODUÇÃO AO PENSAMENTO DE THOMAS HOBBES


1.1 BIOGRAFIA E CONTEXTO HISTÓRICO

Thomas Hobbes (1588-1679), inglês de família pobre, conviveu com a nobreza, de quem recebeu apoio e condições para estudar. Desde a infância mostrou uma grande predileção pelos estudos clássicos, tanto que, com apenas 15 anos, traduziu do grego para o latim Medéia, de Eurípides.[1]
Na Itália teve a oportunidade de encontrar Galileu e na França entrou em contato com os círculos cartesianos. Viveu até os 92 anos.
Dedicou-se entre outros assuntos, ao problema do conhecimento, tema básico das reflexões do século XVII, representando a tendência empirista. A fama de Hobbes está ligada principalmente ao Leviatã, texto em que expressou com a máxima clareza as doutrinas do mecanicismo científico e do absolutismo político. Por ter aplicado pela primeira vez os princípios do mecanicismo às funções mentais, reduzindo o pensamento a operações aritméticas de adição e subtração, Hobbes é hoje considerado o antepassado longínquo da atual cibernética.[2]
Suas obras foram: Objeções às Meditações Metafísicas de Descartes (1641); Do Cidadão (De Cive; 1642); Leviatã (1651); Do Corpo (De Corpore; 1655); O Tratado do Homem (De Homine; 1658); Diálogo entre um Filósofo e um Estudante de Direito Consuetudinário Inglês (1666).


1.2 O PENSAMENTO HOBBESIANO

Diferente do pensamento Aristotélico de que o homem é animal político, para Hobbes “o homem não é um animal naturamente social”, pois cada homem não é de modo algum ligado aos outros homens por um consenso espontâneo, como o dos animais, que se baseia em um apetite comum.  Para ele existem entre os homens motivos de contendas, invejas, ódios e sedições que não existem entre os animais.
Fazendo um paralelo entre os animais e os humanos, Hobbes reflete sobre algumas diferenças fundamentais: o bem de cada animal que vive em sociedade não difere do bem comum; ao passo que no homem o bem privado difere do bem público; os animais não percebem defeitos em sua sociedade, ao passo que o homem os percebe, querendo introduzir contínuas novidades, que constituem causas de discórdia e guerras; os animais não têm a palavra, que nos homens é frequentemente usada para ofender e provocar revoltas; os animais não se censuram, ao passo que os homens sim; nos animais o consenso é natural, enquanto que nos homens não o é. [3]
A condição natural em que os homens se encontram é uma condição de guerra de todos contra todos. Cada qual tende a se apropriar de tudo aquilo de que necessita para a sua própria sobrevivência e conservação.
Para Hobbes é preciso que todos os homens transfiram a um único homem (ou a uma assembleia) o poder de os governar, e esse “pacto social” não é firmado pelos súditos com o soberano, mas sim pelos súditos entre si. O soberano fica fora do pacto, permanecendo como o único a manter todos os direitos originários. O poder do soberano (ou da assembleia) é indivisível e absoluto.[4]
O poder do Estado deve ser exercido pela força, pois o ser humano necessita de ser controlado com força. Os pactos sem espada são meras palavras. Na visão de Hobbes, esse estado de repressão e censura é melhor do que a condição de indivíduos entregues a si mesmos.[5]          
Hobbes apresentou essas ideias primeiro em sua obra Do Cidadão e depois em Leviatã. Nesta última compara o Estado a uma criação monstruosa do ser humano, destinada a por fim à anarquia e ao caos das relações humanas.


2 ELEMENTOS CENTRAIS DA FILOSOFIA POLÍTICA DE THOMAS HOBBES


2.1 O ESTADO DE NATUREZA

O direito natural tem sua origem no jusnaturalismo, e consiste numa ideia racional de direitos inatos, universais e inalienáveis, que preexistem no homem através mesmo da existência das sociedades, ou seja, no estado de natureza, antes mesmo ao pacto social, que acontece quando as pessoas abrem mão desses direitos por meio de uma legislação que estabelece os limites necessários para que todos sejam beneficiados, harmonizando a vida coletiva.
O direito natural nasce a partir do momento em que surge o homem.  Essa ideia de direito natural, desde o pensamento antigo (exceto em relação aos sofistas), esteve sempre associada à realização da justiça, definida com base nas leis eternas, imutáveis, provenientes da observação do cosmos ou da revelação divina. Portanto, até o Iluminismo, o direito natural não era conhecido como uma criação humana; sendo apenas uma constatação pelo homem de leis que sempre estiveram na natureza, anteriores à sua própria condição de ser e existir, prontas a serem reconhecidas e aplicadas. [6]
Na concepção moderna de direito natural, a justiça permanece como fundamento e critério de validade do sistema jurídico, mas todo processo deve passar pelo critério da razão e validação do que é justo.[7]
Todavia, Hobbes considerava que esse direito natural só levaria à guerra de todos contra todos e à sua destruição, sendo necessária a criação de um direito positivo ou um contrato social que poderia ser garantido por meio de um poder centralizado que estabeleceria regras de convívio e pacificação. No estado de natureza, cada qual tende a se apropriar de tudo o que necessita, não havendo limites impostos pela natureza, nascendo a predominância de uns sobre os outros. Nesse contexto, Hobbes utiliza a expressão de Plauto homo homini lupus "o homem é lobo do homem". Ele arrisca seu bem primário, a vida, tornando-se só, com o medo.[8]


2.2 O FIM DO CONFLITO: OS DITAMES DA RETA RAZÃO


A razão humana surge como saída do estado de natureza. A faculdade de utilizar o raciocínio, entendido como um cálculo que permite a partir de premissas se chegar a conclusões, dá ao homem, segundo Hobbes, a possibilidade de determinar quais os meios necessários para se chegar a determinado fim, agindo assim segundo seus próprios interesses.
A reta razão, para Hobbes, faz parte da natureza humana, e é aquilo que o torna capaz de conhecer as causas e agir seguindo regras que indiquem os caminhos mais acertados para atingir os fins almejados.
A “lei da natureza” é o ditame da reta razão que corresponde aquilo que o homem deve fazer ou omitir, com o intuito de assegurar-lhe a conservação da vida e do corpo. Essa regra se divide em duas leis: a primeira e fundamental tem como princípio a busca pela paz e sua obtenção e a segunda é defender-se com todos os meios possíveis.[9]
Essas regras são regras de prudência e, portanto, a obrigação a essas regras está subordinada ao fim que se deseja alcançar. Contudo, esse fim deve ser observado por todos, caso contrário não será alcançado. O único caminho capaz de tornar eficazes as leis naturais e fazer a atuação humana racional, é a instituição de um poder irresistível que torne desvantajosa toda ação contrária, ou seja, o poder do Estado. [10]
A lei natural prescreve que não se deve cometer roubo, homicídio, adultério e injúria, mas é a lei civil que decide o que deve ser entendido como roubo, homicídio, etc.
Para que os homens alcancem a paz, também é necessário que eles concordem em instituir um estado que torne possível uma vida segundo a razão, em um ato de vontade. Assim, o Estado fica entendido como resultado da vontade humana. Mas, para que isso ocorra deve ser instituído na sociedade um pacto de união, um contrato de submissão, um compromisso unilateral onde só nasçam às obrigações dos súditos para com o soberano e deste para com os súditos.[11]


Uma pessoa de cujos atos uma grande multidão, mediante pactos recíprocos uns com os outros, foi instituída por cada um como autora, de modo a ela poder usar a força e os recursos de todos, da maneira que considerar conveniente, para assegurar a paz e a defesa comum.[12]


Os súditos devem transferir o direito de se governar a si mesmo, para o soberano ou uma assembleia, autorizando todas as suas ações. Um pacto entre indivíduos e não entre o povo e o soberano, o poder instituído ao soberano é irrevogável e indivisível (o deus mortal).
O Estado para Hobbes representa uma multidão de homens unidos em uma pessoa por um objetivo comum em defesa da paz; sua vontade, selada por um pacto, representa a vontade de todos e pode servir-se das forças e bens dos indivíduos, a fim de obter a paz e a defesa do bem comum.


  
2.3 A RELAÇÃO ENTRE ESTADO E IGREJA

Para que os homens se tornem seguros e sobrevivam, cada indivíduo, deve se  associar ao pacto social, abdicar do direito natural que é transformado em direito civil ou positivo, um direito artificial, que vai tentar suprir a fragilidade do direito natural e do uso da força garantindo a vida, a liberdade e a propriedade privada dos governados. Com base nesse contrato, o uso da força passa a ser direito exclusivo do estado, justificado e restrito à defesa da liberdade comum, quando se fizer necessário.[13]
Ainda, Hobbes traz em sua obra O Leviatã, regras que permitem concretizar o instinto de autoconservação, que veta ao homem fazer-lhe o que é ruim, denominadas lex naturalis ou "leis da natureza". Ele alerta que, sozinhas, não são suficientes, para constituir uma sociedade, sendo necessário um poder que obrigue os homens a cumpri-las, ou seja, é necessário delegar a um homem ou a uma assembleia o poder de representar o povo.
Esse pacto, firmado pelos súditos entre si e garantido pelo soberano deram origem ao Estado. Para ele, pelo soberano não participar do pacto, o Estado era absoluto e independente de qualquer universo religioso.[14]
Nessa concepção, a figura estatal era vista como soberana e absoluta, onde atuava como modelo final e era capaz de decidir os conflitos entre os cidadãos e garantindo também certos direitos, como exemplo, a estabilidade. Os direitos dos cidadãos tornavam-se irrevogáveis, ele estava acima da justiça e a própria Igreja deve-se sujeitar à ele diferentemente do que acontecia anteriormente. O Estado pode interferir na religião, interpretando-a, mas não o contrário.
Vale ressaltar que a narração hobbesiana difere um pouco daquelas efetivadas posteriormente, pois desde os tempos imemoriais, o homem intuitivamente acreditava na existência de uma ordem jurídica superior àquela por si criada. Esse conceito diz respeito ao direito natural, que consiste em uma agregação de normas jurídicas criadas pela natureza ou pelos deuses e que, de alguma forma, são capazes de expressar um ideal absoluto de justiça. Dessa forma, segundo os jusnaturalistas, as normas independem do Estado, pois a este cabe apenas cumpri-las e preservá-las, jamais criá-las. Essas ideias, entretanto, vêm na contramão do ideal defendido por Hobbes, pois, para ele, a razão humana é capaz de constituir por si só a mecânica estrutural da comunidade, sem que seja necessário qualquer apelo à divindade.[15] 
Com isso, percebe-se que a justificativa de Hobbes para o poder absoluto é estritamente racional, completamente livre de qualquer tipo de religiosidade e sentimentalismo, negando implicitamente a origem divina do poder, afirmando que a Igreja deve ser uma instituição nacional e, por conseguinte, sujeita às autoridades civis.
Sabe-se, contudo, que Hobbes não teve êxito em sua defesa, que era a separação total entre Estado e religião. Desse modo, o que o filósofo propôs, ou seja, a independência da esfera politico-jurídica diante da autoridade religiosa, não ocorreu naquela época, uma vez que o laicismo só surgiu depois.
Portanto, o direito natural e seu oposto foram discutidos de forma consistente por Thomas Hobbes e sua contribuição filosófica para a sociedade da época foi considerável e importantíssima para a construção de uma mentalidade mais aberta no que tange ao pensamento livre.


3 CONSIDERAÇÕES FINAIS


Thomas Hobbes inicia uma discussão sobre o estado de natureza em que o homem vive pelo instinto de sobrevivência em que instaura-se um guerra contra todos. O medo leva o homem a viver no estado civil, que, associado à razão, leva o homem a almeja a paz. Associados por um acordo, renunciam aos seus direitos naturais e submetem-se ao poder soberano, o qual é obrigado a assegurar o respeito ao contrato social, a garantia da paz e da segurança individual.
Para um desempenho efetivo, esse soberano deve ser absoluto e inquestionável, sem subordinação, principalmente religiosa, que garantirá a convivência pacífica dos homens. Nesse sentido, percebe-se que Hobbes tem uma pensamento absolutista e laico que introduz a era moderna, numa busca pela legitimação do poder, num momento revolucionário em que a burguesia se tornava cada vez mais poderosa.
Para Hobbes, o que funda o poder político e as relações sociais não é o respeito ao próximo (Moral), o temor a Deus (Religião), os interesses nacionais (Razões de Estado) ou a honra (Códigos da nobreza), mas sim, o interesse próprio, o bem estar e a segurança de cada indivíduo na esfera da vida privada (Utilidade).[16]


REFERÊNCIAS

AMORIM, Maria de Fátima. Filosofia. Volume 3: Ensino Médio.Belo Horizonte:Editora Educacional. 2014.
BENJAMIM, Cássio Corrêa. O jusnaturalismo moderno. Fragmento. Disponível em http://www.seer.ufu.br/index.php/EducacaoFilosofia/article/viewFile/571/516. Acesso em 15 jun 2015.
FILOSOFIA POLÍTICA. O pensamento político de Thomas Hobbes. Tema 03. Material complementar.
HOBBES, Thomas. Leviatã. Trad. de João Paulo Monteiro e Maria Beatriz Nizza da Silva. Disponível em: http://www.ead.ufes.br/pluginfile.php/23045/mod_resource/ content/1/O%20Leviat%C3%A3%20de%20Thomas%20Hobbes.pdf. Acesso em 09 jun 2015.
YAMAUTI, Nilson Nobuaki. A teoria política hobbesiana. 2001. Disponível em: http://www.urutagua.uem.br//ru02_politica.htm. Acesso em: 16 jun 2015.
MATOS, Andityas Soares de Moura Costa. O pensamento jurídico de Thomas Hobbes. 2009. Disponível em: http://www.iptan.edu.br/publicacoes/ saberes_interdisciplinares/pdf/ revista03/O%20PENSAMENTO%20JURIDICO.pdf. Acesso em 04 jun 2015.
MEIER, Celito. Filosofia: por uma inteligência da complexidade. Belo Horizonte: Pax, 2014. p.271-281.
NICOLA, Ubaldo. Antologia ilustrada de filosofia: das origens à idade moderna. Tradução: Maria Margherita De Luca. São Paulo: Globo, 2005. p. 235-240.
REALE, Giovanni. ANTISERI. Dario.História da Filosofia: Do humanismo a Kant. São Paulo: Paullus. Vol. II. 1990.





[1] NICOLA, Ubaldo. Antologia ilustrada de filosofia: das origens à idade moderna. Tradução: Maria Margherita De Luca. São Paulo: Globo, 2005. p. 235.
[2] NICOLA, Ubaldo. Antologia ilustrada de filosofia: das origens à idade moderna. Tradução: Maria Margherita De Luca. São Paulo: Globo, 2005. p. 236.
[3] MEIER, Celito. Filosofia: por uma inteligência da complexidade. Belo Horizonte: Pax, 2014. p.272 e 273.
[4] MEIER, Celito. Filosofia: por uma inteligência da complexidade. Belo Horizonte: Pax, 2014. p.278.
[5] MEIER, Celito. Filosofia: por uma inteligência da complexidade. Belo Horizonte: Pax, 2014. p.278.
[6] AMORIM, Maria de Fátima. Filosofia. Volume 3: Ensino Médio.Belo Horizonte:Editora Educacional. 2014. p.30.
[7] Naturalmente os homens são desiguais: alguns são mais fortes e outros mais fracos, alguns mais inteligentes, outros menos, alguns são mais aptos a comandar, outros não possuem tal capacidade. Contudo, tais diferenças não dão a um homem o direito de impor a sua vontade a outros ou de os submeter à sua autoridade. Isto porque todos são, por natureza, capazes de conduzir a si mesmos. A ideia de igualdade significa que não existe uma diferença entre os homens, dada pela natureza, da qual decorram os direitos. Uma desigualdade de aptidões não implica uma desigualdade de direitos. BENJAMIM, Cássio Corrêa. O jusnaturalismo moderno. Fragmento. Disponível em http://www.seer.ufu.br/index.php/EducacaoFilosofia/ article/viewFile/571/516. Acesso em 15 jun 2015.
[8] "O homem é lobo do homem", que no entanto, não tem o significado de sinistro e radical pessimismo moral pois pretende ser uma constatação estrutural indicando uma situação à qual se deve dar remédio. "Certamente afirma-se com razão tanto que o homem é um deus para o home como que o homem é o lobo do homem, o primeiro em relação aos conciliados e à justiça e o segundo em relação aos Estados e à insolência dos bons e dos maus. REALE, Giovanni. ANTISERI. Dario. História da Filosofia: Do humanismo a Kant. São Paulo: Paullus. Vol. II. 1990.
[9] FILOSOFIA POLÍTICA. O pensamento político de Thomas Hobbes. Tema 03. Material complementar.
[10] FILOSOFIA POLÍTICA. O pensamento político de Thomas Hobbes. Tema 03. Material complementar.
[11] FILOSOFIA POLÍTICA. O pensamento político de Thomas Hobbes. Tema 03. Material complementar.
[12] HOBBES, Thomas. Leviatã. Trad. de João Paulo Monteiro e Maria Beatriz Nizza da Silva. Cap. XVII, p. 61. Disponível em: http://www.ead.ufes.br/pluginfile.php/23045/mod_resource/content/1/O%20Leviat%C3% A3%20de%20Thomas%20Hobbes.pdf. Acesso em 09 jun 2015.
[13] AMORIM, Maria de Fátima. Filosofia. Volume 3: Ensino Médio.Belo Horizonte:Editora Educacional. 2014.p.37.
[14] REALE, Giovanni. ANTISERI. Dario. História da Filosofia: Do humanismo a Kant. São Paulo: Paullus. Vol. II. 1990.p.499.
[15] MATOS, Andityas Soares de Moura Costa. O pensamento jurídico de Thomas Hobbes. 2009. Disponível em: http://www.iptan.edu.br/publicacoes/saberes_interdisciplinares/pdf/revista03/O%20PENSAMENTO% 20JURIDICO.pdf. Acesso em 04 jun 2015.
[16] YAMAUTI, Nilson Nobuaki. A teoria política hobbesiana. 2001. Disponível em: http://www.urutagua.uem.br//ru02_politica.htm. Acesso em: 16 jun 2015.